terça-feira, 27 de março de 2012

O ESCÂNDALO DO VENENO – CAP. 4

Postado por: SOS DIRLEI
 
Charles Domingues




Neste domingo (25) o jornalista Cesar Pinho postou em sua coluna o capítulo 3 da série o escândalo do veneno. Hoje posto o capítulo 4, com a aguardada entrevista de um especialista. Trata-se de Charles Domingues, graduado em Gestão Ambiental, Químico, especialista em águas e pós-graduando em Saneamento Ambiental e Engenharia Ambiental, blogueiro (charlesdomingues.blogspot.com) e colunista do blog Cartão Vermelho, do meu amigo Álex Garcia.

Domingues foi contundente:

“É uma constatação a nível mundial. O uso desse herbicida pode causar muitos e graves problemas”.

“Se o prefeito tivesse noção da gravidade da aplicação do Roundup com certeza não autorizaria esse tipo de prática”.

“Pelo Brasil, vários municípios aprovaram projetos de lei proibindo o uso de qualquer tipo de capina química, com base no Glifosato, outros proíbem até mesmo a comercialização. E por que Cabo Frio deve ser diferente”?



Blog SOS DIRLEI

Qual a definição de capina química?

Charles Domingues

É uma forma de controlar plantas daninhas com uso de herbicida. Esses produtos têm em sua formulação componentes com capacidade, de depois de aplicados, manter as áreas livres dessas plantas por um longo tempo, diferente da capina manual que é aquele método convencional que todos conhecem.

SOS Dirlei

Por que existe tanta polêmica em relação ao emprego desse agrotóxico?

Charles Domingues

Não seria bem uma polêmica. É uma constatação a nível mundial. O uso desse herbicida pode causar muitos e graves problemas.

SOS DIRLEI

Por que você se refere à Herbicida e não ao nome do produto?

Charles Domingues

O que acontece é que assim como um medicamento, ou um simples refrigerante, ambos tem em sua fórmula um componente chamado princípio ativo. No caso desse herbicida, especificamente, a fórmula seria o Glifosato, que é um herbicida que mata qualquer tipo de planta. Na verdade ele foi desenvolvido pelo fabricante para matar ervas. É importante deixar isso claro.

Nossa atenção deve estar voltada para o composto ativo do herbicida, que é o Glifosato.

SOS DIRLEI

Quando o produto está sendo aplicado, quais as formas de segurança que um usuário deve adotar?

Charles Domingues

Essa é uma pergunta que pode ser respondida de uma maneira muito prática. Assim como os soldados utilizam seus equipamentos de proteção, que fazem parte de seu uniforme, seja capacete, roupas, coturnos e etc., nós, no desempenho de nossas funções, também precisamos utilizar o EPI’S (equipamentos de proteção individual), nesse caso não precisa nem ser questionado se o profissional deveria ou não utilizar os EPI´S, isso é lei. O que precisa ser caracterizado é o grau de risco do produto utilizado ou da função que está sendo exercida, e compatibilizar o EPI.

SOS DIRLEI

E se o usuário não usar os equipamentos, de proteção o que pode acontecer?

Charles Domingues

São duas vertentes a primeira ele não usando o EPI, pode ser contaminado de forma direta, pelas vias respiratórias, pele, visão e etc. A outra, é a contaminação que ele pode proporcionar com o uso do herbicida, no caso de uso de todos os EPI’S adequados o profissional ficará protegido teoricamente, mas o problema é a contaminação que uma possível névoa, chuva e processos de lixiviação que arrastaram para os cursos d’água resíduos de produtos, podendo causar contaminações a jusante além da possibilidade de residuais do produto percolarem pelo solo e alcançarem os mananciais subterrâneos. Por isso precisamos analisar caso a caso o assunto contaminação.

SOS DIRLEI

O senhor acha que a prefeitura desconhece os malefícios da aplicação do Roundup?

Charles Domingues

Não tenho qualquer dúvida disso. Se o prefeito tivesse noção da gravidade da aplicação do Roundup com certeza não autorizaria esse tipo de prática.



SOS DIRLEI

Existe alguma prova de que o uso desse veneno causa problemas ao ser humano?

Charles Domingues

Existem não só vários estudos no mundo incluindo, alguns realizados no Brasil, como também vários municípios brasileiros estão se preocupando com o uso indiscriminado desse herbicida e criando formas legais de controlar a comercialização ou até mesmo proibir o uso dos mesmos.

SOS DIRLEI

Você pode falar sobre alguma forma de controle ou proibição?

Charles Domingues

Dentre vários existem dois estudos a meu ver que encabeçam a lista de grandes estudos com relação ao uso do Glifosato como herbicida em centros urbanos:

CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) no ano de 2010 publicou um estudo onde encontrou resíduos de Glifosato nas águas do rio Corumbataí, mesmo o fabricante do produto garantindo que residuais não chegariam aos corpos hídricos.

Outro estudo muito importante é o da prefeitura de Campinas. O Município solicitou um profundo estudo junto à secretaria municipal de saúde, que decidiu proibir de imediato a aplicação do Glifosato naquela cidade paulista.

Além de estudos com relação à utilização do herbicida, acrescenta-se a esses, vários projetos de lei em tramitação, sendo alguns já aprovados, proibindo a prática da capina química urbana, assim como a comercialização do Glifosato.

E por fim a própria ANVISA emitiu uma nota que inclusive você postou em seu blog, que deixa bastante claro que independentemente do composto a ser utilizado, a capina química urbana, não é autorizada pela Agencia Nacional de Vigilância Sanitária.

SOS DIRLEI

O senhor acha, então, que Cabo Frio deve suspender imediatamente o uso do Roundup.

Charles Domingues

É a própria nota técnica da ANVISA que determina isso, ao não recomendar o uso de herbicidas em capina química em centros urbanos. Agregado a isso, existem vários estudos relacionando o uso desse herbicida a possíveis problemas na saúde humana e até mesmo de ordem ambiental. Não existe garantia e nem recomendação técnica que permita a aplicação destes produtos em área urbana.

SOS DIRLEI

E com relação a contaminação do meio ambiente o que você tem a dizer?

Charles Domingues

O que precisa ser avaliado é o real potencial de riscos sanitários e ambientais desses produtos químicos para a saúde humana e o equilíbrio ambiental. Depois da nota da ANVISA, não existe produto no mercado brasileiro devidamente licenciado para uso em ruas, calçadas terrenos e etc.

Quando a Anvisa proibiu o uso de qualquer herbicida em capina química, foi devido ao princípio da precaução, ou seja, o que acontece quando o produto alcança ou não o lençol freático? E se alcançar o que pode acontecer? Devido a muitas dúvidas e a necessidade de se realizarem vários estudos a Anvisa de uma forma muito prudente vetou o uso do herbicida base Glifosato, proibindo de forma definitiva o seu uso em capina química.

SOS DIRLEI

O uso desse produto em capina química urbana pode ser considerado um crime ambiental?

Charles Domingues

Sendo comprovado o seu uso de forma indevida existem tanto na lei de agrotóxicos como na lei de crimes ambientais artigos diretamente relacionados, como já vimos, a ANVISA não autoriza o uso do Glifosato em capina química urbana, aliado a isso como mencionei existe a Lei de Agrotóxicos e Afins nº 7.802, de 89, que menciona em seu artigo 15, que aquele que produzir, comercializar, transportar, aplicar, prestar serviço, der destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, em descumprimento às exigências estabelecidas na legislação pertinente estará sujeito à pena de reclusão, de dois a quatro anos, além de multa. E por fim temos a lei de Crimes Ambientais, Lei 9.605, de 12/02/98, o qual estabelece uma pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa para quem usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente.



SOS DIRLEI

Qual a mensagem que você gostaria de deixar?

Charles Domingues

As pessoas precisam estar mais esclarecidas, especialmente em uma época em que lutamos tanto pela vida no planeta, como pela saúde pública, hoje temos até o dia mundial da água, nós seres humanos fazemos parte do meio ambiente então se nós o preservarmos, estaremos automaticamente nos preservando.

Eu não posso aceitar a prática de capina química realizada nas calçadas, praças, meio-fio, e etc., essa prática geralmente efetuada por funcionários que na maioria das vezes sequer sabem o que estão fazendo, além dos riscos que estão correndo quando se aplica um produto desse tipo. Os riscos de uma contaminação pontual (local) ou difusa são grandes, uma fonte de contaminação que dependendo de quem estiver no ambiente diretamente afetado, tocar, dependendo para onde soprar o vento, ou para onde as águas de chuvas carregaram, vão sem dúvida alguma impactar o meio. É uma fonte potencial de risco de exposição para adultos, crianças, flora e fauna, existentes no entorno.

Quem autoriza essa prática precisa parar e pensar nos danos que pode causar ao cidadão e ao meio ambiente. Nós já lutamos tanto contra a poluição dos corpos hídricos, contra a destinação incorreta dos resíduos (lixo), contra a poluição atmosférica, contra o aquecimento global, contra as mega construções em éreas de preservação permanente - APP, dentre tantas, e agora o administrador resolve inserir nessa estatística mais uma forma de contaminação? Isso não pode mais acontecer. Pelo Brasil, vários municípios aprovaram projetos de lei proibindo o uso de qualquer tipo de capina química, com base no Glifosato, outros proíbem até mesmo a comercialização. E por que Cabo Frio deve ser diferente?

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